Share |

Intervenção 25 de Abril em Baguim do Monte por Joaquim Espirito Santo

Exmo. Sr. Presidente da Mesa da Assembleia de Freguesia

Exmo. Sr. Presidente da Junta de Freguesia

Sras. e Srs. Autarcas

Sras. E Srs. Representantes de colectividades

Autoridades Civis e Militares

Sras. e Srs. Convidados

……………………………………………………………………………………………………………………….

“Há muitos anos, num país muito distante, vivia um povo infeliz e solitário, vergado sob o peso de uma misteriosa tristeza.

O céu era alto e azul, os campos férteis, o mar e os rios cheios de peixe e de vida, as cidades quentes e luminosas, mas as pessoas que passavam entreolhavam-se com olhos tristes, caminhando apressadamente e sumindo-se dentro das casas; e quando se encontravam umas com as outras, nos cafés, nos empregos, na rua, falavam baixo, como se alguma coisa, um segredo terrível, as amedrontasse”.

                                                                  António Manuel Pina, O Tesouro, Abril

……………………………………………………………………………………………………………………………………………………………………….

Para qualquer um de nós, aqui reunidos para comemorar o Dia da Liberdade, “o dia em que se abriram as portas a todos os sonhos”, não será difícil adivinhar que o pequeno texto do falecido grande mestre da literatura, António Manuel Pina, que acabo de citar, se refere ao país que era Portugal no tempo da ditadura, o Portugal de antes do 25 de Abril, um Portugal de pessoas tristes e amedrontadas, que falavam baixo, que, apesar dum país com céu alto e azul, apesar de um país com cidades quentes e luminosas, viviam no medo, infelizes e solitárias.

A liberdade, a democracia e a alegria que lhe está associada, foi o que de mais precioso nos trouxe o 25 de Abril. A liberdade de poder mudar e de decidir quem verdadeiramente somos ou queremos ser.

Faz hoje 40 anos que os militares de Abril pegaram em armas para libertar o povo da opressão da ditadura salazarista/marcelista. Por isso, quero, antes de tudo, daqui saudar esses militares corajosos que enfrentaram o medo, tornando-se na cabeça da conquista da liberdade e da derrota da opressão, para que, hoje, não abdicando da condição de cidadãos livres, conscientes das nossas obrigações, possamos levantar a voz em defesa dos mesmos valores de Abril, que enformam a Constituição da República.

Hoje, como esses militares de então, seremos capazes de vencer o medo, a apatia e o conformismo, com que nos querem de novo amarrar. Estaremos à altura desse legado, saberemos dizer não ao actual estado de coisas.

Hoje, assistimos, pela mão dos nossos governantes, à tentativa de destruição do Estado Social e de todas as grandes conquistas de Abril, que permitiram ao povo português recuperar a dignidade que a ditadura lhe recusara.

Hoje, falar do 25 de Abril é lembrar a memória de quem resistiu à mais longa ditadura do século XX, é lembrar os mais de 50.000 presos políticos entre 1926 e 1974, os mais de 80 resistentes assassinados pela Pide, a censura que amordaçou escritores e jornalistas, os professores expulsos, o analfabetismo, a miséria e os milhares de vítimas da guerra colonial.

Falar do 25 de Abril é falar dum povo que encheu as ruas e praças deste país, dum povo que lutou para acabar com a exploração. 

Custou muito fazer um país novo. Conquistar a paz, o pão, a habitação, a saúde e a educação foi muito difícil. Os beneficiados pelo regime fascista de Salazar e Caetano fizeram tudo para manter os seus privilégios. Até no dia da aprovação da Constituição, em 2 de Abril de 1976, adireita organizada no MDLP assassinou Maximino Barbosa de Sousa, o Padre Max e a estudante Maria de Lurdes Correia.

Finalmente 38 anos passados foi-lhe atribuído, ao padre Max, o nome de uma rua em Vila Real. Falta fazer o mesmo à Maria de Lurdes. É o mínimo que se pode fazer a estes dois combatentes da Liberdade.

 

O governo do PSD/CDS, defendendo interesses outros que não os do povo, tenta atirar as culpas da crise para cima desse mesmo povo, que, supostamente, terá vivido acima das suas possibilidades.

Não há mentira mais torpe!

Hoje, 40 anos após o 25 de Abril, o governo, apoiado pelo FMI, Comissão Europeia e Banco Central Europeu está a empobrecer o povo português e a atacar a Constituição, os direitos laborais, os salários e as pensões dos reformados.

Assistimos cada vez mais a um discurso populista que tenta branquear o salazarismo/marcelismo, esse regime negro de opressão, de guerra, de tortura, de assassinato, enfim, do crime legalizado.

Assistimos a uma vingança em relação aos ideais e conquistas de Abril, por parte dos nossos governantes que se materializa nos ataques ao SNS, à Escola Pública, ao poder local e até mesmo à Constituição da República, hipocritamente culpabilizando-os daquilo que é incompetência deles.

Este governo lançou sobre a população o mais violento ataque de que os portugueses da minha geração têm memória.

Este é um Governo que ataca os rendimentos do trabalho e dos pensionistas, ao mesmo tempo que acarinha os rendimentos do capital financeiro.

É um Governo que chama privilégios aos direitos sociais dos cidadãos e por isso os restringe ou mesmo elimina, ao mesmo tempo que chama direitos adquiridos aos privilégios dos grandes grupos capitalistas e por isso os mantém, quando não os reforça.

Em suma, é um Governo que destrói a economia e a subjuga a interesses estrangeiros, um Governo que ataca a democracia e o poder local.

Este governo lançou um ataque sem tréguas ao poder local e à regionalização, através da Lei de Reforma Administrativa Territorial Autárquica, extinguindo centenas de freguesias, logo seguida da Lei 104/12, que retira poder às autarquias e da Lei 122/XII, que retira autonomia financeira às autarquias.

Hoje milhares de jovens são empurrados para a emigração. Mais de 1 Milhão de portugueses estão desempregados e sem nenhuma perspetiva de voltar a ter emprego. Deste número gigantesco de desempregados 16.720 são do nosso concelho. Estamos perante uma tragédia a que é preciso pôr fim.

A estrutura social que hoje temos em Portugal pouco tem a ver com o 25 de Abril. Os figurões do dinheiro estão a conseguir destruir tudo o que de bom foi construído pelo povo português nas últimas décadas.

Agora, com o chamado Tratado Orçamental, querem condenar os povos da Europa a não terem qualquer financiamento público para a educação, para a saúde, ou para a segurança social. Tudo será para entregar à cobiça dos privados, dos transportes às pensões.

A tudo isto temos de dizer BASTA.

Por isso, e para terminar, hoje, talvez mais que nunca desde 1974, pesa sobre todos nós a responsabilidade da defesa da liberdade e dos direitos que, numa atitude de extrema coragem e heroísmo, os jovens capitães de Abril permitiram que o povo português alcançasse.

Hoje, as bandeiras de Abril continuam a ser factor de unidade e de exigências que importa reafirmar e cumprir.

Termino mesmo parafraseando o poeta e cantor Zeca Afonso que, referindo-se à Liberdade, escreveu estas palavras simples mas actuais e profundas: “quero-te mais do que à morte, quero-te mais do que à vida”.

 

Viva a democracia!

Viva a liberdade!

Viva o 25 de Abril!